A Polícia Científica de Goiás confirmou que era de Murilo Ramos de Souza, de 25 anos, o sangue encontrado no banco de trás do carro Hyundai IX35, que estava com quatro suspeitos mortos em ação policial em Anápolis. O resultado do exame de DNA, que ficou pronto na tarde desta terça-feira (6), é um sinal de que o jovem foi ferido dentro do veículo, mas ainda precisa ser apurado se foi este ferimento que provocou a morte do rapaz.

Murilo desapareceu na noite do dia 26 de setembro depois de sair de casa, em Itapuranga, no Hyundai da mãe. Horas depois, na madrugada do dia 27, quatro jovens que estavam com o carro de Murilo foram mortos em uma suposta troca de tiros com policiais militares em Anápolis. O corpo do estudante foi encontrado nove dias depois, na manhã do dia 5 de outubro em uma fazenda de Anápolis, cerca de 5 km da residência onde os suspeitos foram mortos. A forma como o homicídio ocorreu ainda está sendo apurada.

“Com certeza (Murilo) foi ferido dentro do carro. Não se sabe se ferido letalmente”, explica um dos delegados que investiga o caso, Wlisses Valentim, do Grupo de Investigação de Homicídios (GIH) de Anápolis. Segundo ele, os quatro jovens, suspeitos de roubar o carro e matar Murilo, teriam reagido a abordagem de policiais da Companhia de Policiamento Especializado (CPE) assim que desembarcaram do veículo, em uma casa do bairro Gran Ville.

Os policiais que participaram da ação apreenderam quatro revólveres com os suspeitos. Dentro do Hyundai estavam três objetos de Murilo: um par de óculos, um par de tênis (um sem cadarço) e o documento de identidade. O corpo da vítima foi encontrado com as mãos amarradas para trás com um cadarço. A mancha de sangue, localizada pela perícia, estava em uma parte mais alta no meio do banco de trás do veículo. Amostras do sangue foram comparadas com material genético dos pais de Murilo. O celular do jovem ainda não foi encontrado.

Segundo a Polícia Científica, o corpo da vítima está no Instituto Médico Legal (IML) de Goiânia e deve passar por um exame de ossada, que vai verificar o que produziu as lesões na cabeça de Murilo e o que de fato matou o jovem. Como o exame é considerado complexo, o tempo de permanência do corpo no IML da capital é de cerca de 10 dias. Com esta situação, a família planeja fazer uma homenagem para Murilo e não um velório.

Confronto

De acordo com Valentim, dois dos suspeitos estavam morando em Rialma, cidade vizinha de Ceres, mas eram de Anápolis, onde tinham contatos com pessoas ligadas ao mundo do crime. Por isso, eles já saberiam o local exato de deixar o carro roubado. “Nesta casa já houve a receptação de um carro roubado uma vez, era um local que os bandidos chamam de ‘mocó’. Certamente eles deixariam lá para passar uma noite e levar para um desmanche ou outro local”, avalia o delegado. A residência está disponível para ser alugada, mas estava sendo usada enquanto estava vazia.

Em depoimento, os policiais da Companhia de Policiamento Especializado de Anápolis afirmaram que receberam a informação do roubo do carro e para onde ele seria levado. No entanto, ainda não está claro na investigação quem repassou o relato. A família de Murilo não tinha conhecimento do roubo até ser acionada pela PM de Itapuranga às 5 horas, na madrugada do dia 27, depois que o veículo já tinha sido recuperado.

“A gente precisa checar isso ainda, porque os policiais sabiam exatamente o local onde levariam o carro”, diz Valentim. Ele faz a ressalva de que a informação veio provavelmente de algum informante entre os criminosos. “Acontece muito”.

No início das investigações, chegou a ser ventilado que a denúncia do roubo foi feita de forma anônima e a localização por meio de uma interceptação telefônica. A informação chegou a constar em um infográfico publicado no POPULAR da edição do dia 6 de outubro. No entanto, o delegado Wlisses Valentim, que investiga especificamente o confronto com a CPE, negou esta versão.

Outro delegado responsável pela investigação, Matheus Melo, de Ceres, conta que testemunhas apontam que Murilo encontrou os quatro jovens, que mais tarde seriam mortos pela CPE, por volta das 22h40 do dia 26 no Mirante de Ceres. “Ele (Murilo) desceu do veículo e foi ao encontro destes quatro rapazes. Conversaram durante poucos minutos no Mirante, 4 a 5 minutos apenas. Todos entraram de livre e espontânea vontade no carro e saíram do Mirante. Câmeras de monitoramento mostram que o jovem de Itapuranga ficou 13 minutos no Mirante e que o veículo deixou a cidade, na saída de Rialma, na direção de Anápolis, às 22h58.

“Era meu amigo sempre e verdadeiro” 

Amigos do estudante de Ciências Contábeis, Murilo Ramos de Souza, de 25 anos, relatam sobre a amizade e o perfil calmo e alegre do jovem. Ele foi encontrado morto em uma fazenda de Anápolis na manhã de segunda-feira (5) depois de 9 dias desaparecido. A família aguarda a liberação do corpo, que está no Instituto Médico Legal (IML) de Goiânia, para o sepultamento.

“Quando eu recebi a notícia de confirmação (da morte), aí que a ficha caiu, fui lembrar de todos os momentos que a gente passou, fui relembrar em fotos tudo que vivi com ele. Ele era uma pessoa de dentro da minha casa. Meus pais sempre diziam que era meu amigo para sempre e verdadeiro. Amigo que eu podia confiar”, relata o estudante de publicidade, Matheus Ferreira, de 22 anos, que conheceu Murilo no Ensino Médio, quando estudavam no Colégio Estadual Deputado José Alves de Assis, em Itapuranga.

As opções de lazer em uma cidade com cerca de 25 mil habitantes eram passeios de carro, encontros em lanchonetes e casas de amigos. Os momentos mais marcantes eram quando Murilo e os amigos iam para shows de música em Goiânia e para o tradicional Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental (FICA), que acontecia todo ano na cidade de Goiás. Outros atrativos que ocorriam de vez em quando e que os amigos marcavam presença eram festas em fazendas e de música eletrônica. Um dos artistas favoritos de Murilo era o DJ Vintage Culture, do gênero house music.

Matheus lembra que um dos sonhos do estudante de contabilidade era um dia, se tivesse a chance, morar em Balneário Camboriú, litoral de Santa Catarina. Nas redes sociais, Murilo marcou a cidade como local visitado em agosto de 2016 e o Morro do Careca, que fica no Balneário, em junho de 2019.

O cirurgião dentista Tulio Magalhães, de 25 anos, se aproximou de Murilo nos últimos 5 anos e manteve a forte amizade. Ele lembra do amigo como alguém alegre e tranquilo. “Chegava a ser bobo, meio sonso. Até na fala você via calma. Mandava áudio que poderia demorar 10 segundo e demorava 20 para expressar o que queria dizer”, conta.

Mesmo Tulio morando em Goiânia, os dois se viam com frequência. Juntos viveram muitos momentos de alegria, mas também de “perrengues”, que depois eram relembrados com bom humor.

Tulio lembra que uma vez foi com Murilo e outro amigo foram buscar uma antena de internet em Anápolis e no caminho foram parados pela polícia em Nerópolis porque tinham confundido eles com bandidos. Depois do mal entendido ser explicado, um carro de ferro-velho bateu no veículo dos jovens em Itaberaí. “Soltou uma peça velha, quase que machuca a gente”, lembra.

Surpresa
Tanto Matheus como Tulio dizem não saber o que pode ter acontecido na noite do dia 26 de setembro, na qual Murilo desapareceu. “O que aconteceu realmente foi uma fatalidade. A gente acha que só acontece com pessoas longe da gente, só vê em noticiário e nunca imagina que vai acontecer com alguém próximo. O Murilo não era uma pessoa de muitas amizades, era de poucas amizades de verdade. O que aconteceu é um fato muito estranho e muito doloroso”, diz Tulio.

Foto: Wildes Barbosa

Fonte: Jornal O Popular