Os números e a recorrência de casos registrados nos últimos dias demonstram um cenário triste, quando o assunto é feminicídios em Goiás. Sandra Elisa, Mônica Gonzaga, Karyta Augusto, Maria das Graças e Janys Lima morreram cruelmente assassinadas pelos companheiros, entre os dias 30 de agosto e 7 de setembro, revelando um contexto que se acirra no Estado. Conforme os dados da estatística da Secretaria de Segurança Pública de Goiás (SSP/GO), os registros de feminicídios e de tentativas de feminicídios aumentaram nos oito primeiros meses deste ano, comparados ao mesmo período do ano passado (veja quadro).

Em Goiânia, onde ocorreu o caso mais recente, na tarde de sexta-feira (7), com a morte de Janys Lima de Melo Silva, de 35 anos, os registros de janeiro a agosto deste ano já superam todos os casos contabilizados nos 12 meses de 2017. Em se tratando de tentativas de feminicídios, o total deste ano chega a ser seis vezes maior. E quase sempre são situações resultantes da vontade da mulher de se separar ou de um ciúme possessivo mantido pelo homem. No caso de Janys, foi uma mistura das duas coisas.

O aposentado Jadisson Ferreira de Melo, de 53 anos, diz que nunca vai esquecer da cena que viu quando chegou à casa da filha, no Setor Coimbra, horas depois do ocorrido. As três netas pequenas, que presenciaram o assassinato da mãe, morta a facadas, estavam do lado de fora, sendo socorridas por vizinhos e integrantes do Corpo de Bombeiros. A mais velha delas, inclusive, de apenas 10 anos, precisou ser limpada, pois ficou com o sangue da mãe no corpo, após tentar intervir na briga, segurando o braço do pai. “Ele disse para ela soltar e procurar a avó. Ela e as irmãs saíram correndo pela rua, pedindo ajuda”, relata Jadisson, com indignação.

O marido, Wendel Roberto da Silva, de 37 anos, fugiu, deixando a arma do crime no local, que foi encontrada pelo agentes da Polícia Civil. Segundo o Delegado adjunto da Delegacia Estadual de Investigação de Homicídios (DIG), Dannilo Proto, Wendel utilizou o carro da esposa para fugir, um Corsa branco, e saiu em direção indefinida até chegar a uma mata nas margens da rodovia, entre Ceilândia e Taguatinga, no Distrito Federal. “Ele deixou as filhas para trás e fugiu. Ficou nessa mata por dois dias até ser encontrado ontem (domingo) à tarde”, diz o delegado. O suspeito estava detido até esta segunda-feira em Brasília e será transferido para Goiânia.

Jadisson revela que a filha não tinha se separado, mas pretendia levar adiante o plano que vinha sendo adiado por medo da reação de Wendel. Ela já tinha sofrido agressões anteriores. “Eu dizia para ela manter em segredo, não contar nada e que iria ajudá-la a ir embora. Eu também tinha medo dele fazer alguma coisa com ela, mas estava segurando na mão de Deus”, conta o aposentado. As crianças, de 3, 4 e 10 anos, estão na casa dos avós, que estudam uma forma de aliviar o trauma gerado.

Rotina de proibições e agressões presenciadas pelas filhas

Numa mala trancada com cadeado, o marido de Janys Lima de Melo Silva, assassinada por ele na tarde de sexta-feira (7), em Goiânia, guardava as coisas que ele proibia a mulher de usar.

Segundo o pai da vítima, o aposentado Jadisson Ferreira de Melo, de 53 anos, o genro não permitia nem que ela utilizasse os batons que ganhava da mãe. “A gente dava as coisas para ela e ele pegava tudo e jogava nessa mala. A minha filha não podia usar nem a calcinha que a mãe dava para ela de presente”, conta o pai. A tal mala foi recolhida pelo aposentado na casa da filha, no dia do ocorrido, e levada para a casa onde ele mora, nas imediações do Terminal Padre Pelágio. “Até agora não tive coragem de abrir”, diz emocionado, complementando que foi contra o casamento desde o início, pois não gostava do jeito que o genro se comportava, pois ele não resguardava nem as filhas.

As crianças já chegaram a ligar de madrugada para os avós, aterrorizadas com as brigas. “Uma vez, a neta ligou dizendo que o pai estava querendo matar a mãe enforcada. Ele só não matou, porque a irmã de quatro anos entrou na frente e se jogou no corpo da mãe”, relata Jadisson. Nos registros da polícia, consta uma ocorrência apurada no final do ano passado, quando uma denúncia anônima deu conta da agressão sofrida por Janys, cometida pelo marido. Os agentes foram ao local, mas ela preferiu não levar o caso adiante, por medo.

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