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Para entender Alcides (e Iris) - 27/04/2008

Jornal Tribuna do Planalto – Vassil Oliveira -De 27 de abril a 3 de maio de 2008

Vassil Oliveira

Pois bem. Partamos do princípio de que o governador Alcides Rodrigues (PP) provou que de bobo não tem nada ao forçar na hora certa para ser candidato à reeleição em 2006 e ao surpreendentemente ser reeleito; e que, por não ser bobo nem nada, com tinta e caneta à mão, é claro que tem um plano, apesar de um Estado de gente achar que ele está mesmo é perdido, porque o cargo é maior que ele.

Partamos do princípio, pois, de que tudo que Alcides fez até agora não passou então de preparação para o que virá. E o que será? O seu governo.

Quer dizer. Depois da aprovação pelos deputados da reforma pensada e articulada ao longo de meses, a coisa vai mudar. Vai ganhar outro ritmo. Isso explicaria ele não ter feito de uma tacada só o que vem fazendo em gotas, matando do coração seus adversários internos. Contra o fogo-amigo, o silêncio e a 'canseira'; contra o 'tempo novo', o tempo passando, passando...

Porque, se Alcides perdeu em número de aprovação ao seu governo, em contrapartida ganhou com o seu tempo. Criou condições especiais, próprias, para o que fará, segundo o que estabelecemos por princípio. Por exemplo: para se defender, ou para atacar, ou que seja para contra-atacar, Alcides, ao longo de meses de (in)ação, fragilizou a base aliada a tal ponto que, de rebelde, ela passou a abalada, depois para descabelada, e agora, para submissa.

A dependência ao governo aumentou para todos: para quem quer ou precisa de cargos, para quem busca ser candidato em outubro, para quem tem ou quer ter negócios com a administração estadual. Quem queria romper, já não fala mais nisso, senão marcando data para depois de outubro. Quem gritava, cochicha. Quem conspirava, aguarda, sem saber o que fazer.

Em menos de um ano e meio de governo, Alcides colocou contra a parede toda e qualquer liderança que se arvorou maior que ele. Em vez de passar recibo de perspectiva de poder alheio, confundiu o jogo. Fez o seu. Perspectiva de poder em que direção? Com quem no comando? Iris Rezende (PMDB)? Henrique Meirelles? Outra alternativa? Qual? E ele, Alcides: vai até o último dia do governo ou sai antes? Entra ou não entra na campanha de 2008? E depois?

A confusão política foi criada junto com outra, armada e estendida ao máximo. A da situação das contas do Estado. Em silêncio, Alcides transferiu para as administrações que o antecederam, nas quais era vice, boa parte da carga negativa que sempre carrega quem age maquiavelicamente com mão-de-ferro em início de governo.

O desgaste que poderia ter, não tem. Ao contrário: sem abrir a boca para culpar diretamente quem quer que seja, firmou o conceito de que está arrumando as finanças estouradas por aquele a quem sucedeu. Porque ele, Alcides, ao contrário do outro, governa com res-pon-sa-bi-li-da-de. Está lá, no slogan de sua administração.

Alcides fez mais, em muitos meses. Ele principalmente tapou gargalos por onde vazavam recursos públicos sem dó nem piedade. Está arrumando a casa. E juntando dinheiro. Para quê? Para ele mesmo. Para o que virá – lembremos do princípio.

O governador fez também novos amigos. Novos, sem renegar os antigos. Foi assim que o PMDB, de inimigo político histórico (Arena x MDB; UDN x PSD...), passou a aliado festivo.

E, até agora, confiável. Mais confiável que certos aliados da própria base governista, armados com fogo amigo. Aliás, pode-se dizer até que ter o PMDB como novo amigo ajudou Alcides a recuperar a lealdade que estava sendo perdida em seu reduto. Não totalmente, e talvez por um tempo apenas, mas...

Outro aliado providencial nestes tempos para Alcides: o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Lula estava distante do governo goiano; estava relutante com os encaminhamentos políticos no Estado; estava sem tinta na caneta para Goiás. Hoje, tem o que comemorar: o governador é seu aliado, o prefeito de Goiânia, Iris Rezende, também é, o PP e o PMDB falam em aliança, e o PT já se aliou ao PMDB e pisca o olho esquerdo para a direita, quer dizer, para o PP. E o PSDB, inimigo nacional? Está emparedado tanto pelo inimigo (com Iris 2008/2010; Meirelles 2010...) quanto pelos não mais tão amigos. E vendo Alcides receber providencial ajuda federal. Quer situação melhor?

Com novos amigos, Alcides mostrou que pode tomar novos rumos, se preciso, se fustigado, se provocado, se quiser. E, com tempo ganho, torneiras apertadas, novos rumos à vista em vez de necessariamente tempos novos, o governador consegue outra coisa mais: separar o que, para ele, é o joio, do trigo. Quem é amigo, de quem não é. Quem está do seu lado, de quem não está. Na hora de dividir o poder, isso conta. Muito. Ele sabe hoje com quem pode contar e com quem só pode contar se for para fazer negócio. Político, claro.

Com quem não é bobo nem nada, e por princípio com um plano na cabeça, Alcides fez do silêncio arma de grosso calibre. De reserva, sempre teve à mão uma destruidora (para os contrários) teimosia. Cansou os críticos e as críticas que lhe foram chegando de mansinho ou de supetão, deixando-os sem resposta ou sem fôlego. Mesmo denúncias como a da semana passada, de possível envolvimento em irregularidades com obras da construtora Gautama, acabam por cair no vazio. Têm vida curta. (Só um senão: têm sido assim; não quer dizer que será sempre assim.)

O mais inusitado que pode acontecer a Alcides a partir de agora é ser alvo de noticiário positivo, porque o negativo já foi longe na pauta. E também nisto lhe valeram o silêncio e a teimosia. O que teve seu lado bom. A imprensa ganhou espaço para criticar, para ser imprensa sem as amarras dos governos anteriores. Em contrapartida, teve de aprender a viver mais com menos. Os veículos que só existiam para captar recursos, caducaram. Sim, nem todos. Mas já foi um senhor avanço.

Partindo-se do princípio de que Alcides preparou terreno para o que fará, para o que virá, o governo está com dinheiro em caixa e com condições políticas azeitadas para fazer o que imaginar. Vai poder pagar programas sociais, retomar obras, arrumar as estradas, enfim, vai poder. E governo que pode, é governo.

"Ah, mas ele está muito desgastado e tem menos de dois anos de governo. Não vai dar tempo de fazer nada", dirão os mais céticos. Com razão. Em todo caso, a história ensina que um governo em ação cala a boca dos piores críticos. Se o governo for eficaz, em seis meses o que agora parece errado e fraco será louvado como estratégico e forte, muito forte. Agindo com competência, dois anos é muito tempo. Café morno no Palácio das Esmeraldas, só depois de outubro de 2010.

Um dos lances mais certeiros de Alcides – não esqueçamos o princípio estabelecido – foi a aproximação com Iris. Que, é fato, só aconteceu porque interessava igualmente a Iris.

Ela fortaleceu Alcides por principalmente colocar na roda o PSDB e seus maiores líderes (leia, na página do jornal na internet, edição anterior, “Alcides e Iris colocam o PSDB na roda”). Manteve acesa a possibilidade de divisão de poder com governador para aqueles que tinham a intenção de desistir e partir para o confronto. Iris foi, para Alcides, um 'elemento' estranho a confundir um jogo esquisito.

Para Iris, fica o registro. O ‘caso’ com Alcides tem sido bom em muitos sentidos. Iris ajuda Alcides, que ajuda Iris. Na comunicação, por exemplo, no que o governador fechou o cofre do Estado, o prefeito reinou absoluto com o caixa miúdo da Prefeitura, até bater nos 80% de aprovação, como mostra a pesquisa Tribuna do Planalto/Rádio 730/Grupom desta semana. No campo político, o tempo ao tempo, o longo tempo das guerras veladas, deu no que deu: o governador não quer enfrentar, e o PSDB está com medo... dele. Iris.

Partindo-se do princípio de que tudo aconteceu porque era para acontecer – um tanto programado, outro tanto na esteira dos fatos programados –, Alcides é um gênio político.

Pensou em tudo. Que coisa!
Agora, sem o princípio...

O governo Alcides vai começar quando, mesmo?