Jornal Opção – Reportagens - De: 22 a 28 de junho de 2008
Não é de agora que se fala sobre racha dentro da base aliada estadual, mas a possibilidade de união total em 2010 permanece como sempre
AFONSO LOPES
Após a vitória de Alcides Rodrigues, em outubro de 2006, começou um jogo bruto de puxa e estica dentro da chamada base aliada. A tensão aumentou gradativamente mesmo depois da posse e começo do segundo governo Alcides. O PSDB, com seu objetivo claramente identificado, de manter o máximo possível de espaço dentro do governo, fez elevar a pressão aos maiores níveis até então. O PP palaciano reagiu e a crise se instalou de maneira forte, permanente.
Até recentemente, a leitura que se fazia de todo o processo era de que o cabo-de-guerra resultaria em um rompimento total principalmente entre o PSDB e o PP. Agora, já não se pode afirmar isso com tanta firmeza. O que há é uma intensa busca de posicionamentos visando o processo sucessório de 2010, com cada partido procurando se cacifar para poder negociar com os aliados em melhores condições. Dessa forma, é natural que o PP venha se esforçando bastante para crescer e ocupar a parte que lhe cabe dentro da máquina estadual. E também é natural que o maior ocupante até então, o PSDB, tenha que recuar para permitir o avanço dos pepistas.
Isolamento — Desde o início da crise dentro da base, ou mais especificamente entre o governo e o PSDB, os principais dirigentes pepistas comentavam que o governador Alcides Rodrigues não tinha qualquer intenção de provocar um rompimento definitivo com os tucanos. Poderia até fazer isso se quisesse do ponto de vista da governabilidade, mas teria que trocar o apoio do PSDB pelo PMDB. Isso chegou a ser cogitado por estrategistas de ambos os lados. No governo, pelo temor de que os tucanos iriam declarar guerra a qualquer momento. Ou seja, como precaução. Entre os tucanos, durante avaliações sobre o aprofundamento da crise.
Aparentemente, isso não passou de um breve e rápido momento de maior tensão. Em todo o processo, o governador Alcides Rodrigues foi o esteio que a crise precisava para não se alastrar de forma definitiva e sem possibilidades de superação futura. Na maioria das vezes, seu silêncio serviu como água fria na fervura. Em raras oportunidades, sua batida é que provocou silêncio na arena.
Há paz agora? Não, longe disso. A luta pelos espaços será uma constante até o final deste governo. E essa disputa faz parte do jogo. O que há é a novidade que ela representa no mundo político estadual, e daí a dificuldade até de se compreendê-la totalmente. PSDB, PP, PTB, DEM e PR, os grandalhões da aliança estadual, vão continuar trocando cotoveladas para conquistar espaços. O DEM também? Também. Na realidade, o partido sempre esteve com um pé no governo e outro, desde 2003, fora. Neste momento, está novamente dentro.
O desenrolar dos trabalhos na Assembléia Legislativa é um reflexo que revela a exata dimensão das disputas internas. Sempre que precisou contar com apoio, Alcides teve nos deputados do PSDB, inclusive naqueles muito próximos pessoalmente do senador Marconi Perillo, fidelidade canina. Na votação da autorização da implantação da reforma administrativa, em novembro, essa relação de confiança do PSDB para com o governo foi total. Mais recentemente, na prestação de contas que implantou a reforma, mais uma vez a tucanada se mostrou radicalmente fiel ao governador.
Essa é a forma como a crise tem se dado. Quando em paz, aumenta-se a tensão na briga interna pelo poder. Quando surge ameaça externa, aí PSDB e PP voltam a ser carne e unha com mesmíssimos interesses.
Com seu jeito próprio, mais comedido, silencioso e com paciência de Jó, o governador Alcides Rodrigues tem sido o principal avalista da crise interna no sentido de evitar chacina política entre os aliados. O PSDB reclama dos espaços perdidos, mas o PR também se queixa por não ocupar a Secretaria de Cidades, enquanto o próprio PP demonstra certo incômodo por não ocupar a máquina como gostaria. "Se o governador não fosse quem é, provavelmente a crise já teria terminado em guerra total, principalmente entre o PP e o PSDB", diz um dirigente pepista de Goiânia. Culpa dos tucanos? "Não é por culpa deles ou por nossa culpa. Todos estão pisando nos calos dos vizinhos porque querem ocupar o espaço existente. É natural. Às vezes eles nos pisam, às vezes pisamos neles. Mas continuamos juntos", concluiu o pepista ao Jornal Opção.
Meirelles
De qualquer forma, a grande verdade é que existe também muita desconfiança entre pepistas e tucanos. Recentemente, quando o presidente do PP, Sérgio Caiado, admitiu que o partido gostaria de receber a filiação do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, para avalizá-lo como candidato do partido ao governo do Estado em 2010, a tucanada concluiu de imediato que era uma declaração de guerra à suposta candidatura de Marconi Perillo. Não era, como se viu depois.
O que existe é a perseguição objetiva de se cacifar para a grande mesa de negociações de 2010. O PSDB já tem assento garantido, com a candidatura do senador Marconi Perillo. O PR, certamente, vai sinalizar com o nome do deputado federal Sandro Mabel e, quem sabe, até com a ascensão do vice-governador Ademir Menezes ao governo, em eventual candidatura de Alcides Rodrigues ao Senado. Em ambas as situações, os republicanos estão garantidos na mesa. O DEM deve colocar os nomes de Ronaldo Caiado ou Demóstenes Torres como suas opções. Isso igualmente lhe garante cadeira. O PTB tem Jovair Arantes para igualmente fazer certa pressão. E o PP? Até agora, ninguém. É claro que o partido vai ter lugar privilegiado na mesa de 2010 em função do governador Alcides Rodrigues, mas é pouco. O PP quer ter também um bom nome para apresentar aos demais aliados. No caso, seria Meirelles.
Toda a crise da base aliada, portanto, tem tudo a ver com 2010 e não exatamente com questões pontuais ou desentendimentos casuais e verbais. É claro que as declarações desencontradas de um lado e do outro sempre causam efeitos negativos no relacionamento, mas nunca chegaram ao ponto de azedar a relação de vez.
O processo de afunilamento deste ano em Goiânia é um microcosmo do que deverá acontecer em 2010. Num primeiro momento, todos os partidos irão lançar candidatos ao governo. Aos poucos, essas candidaturas vão se acomodar em nichos próprios. No final, sairá um candidato ao governo do Estado, um vice e dois candidatos ao Senado. Uma dessas vagas deverá ser, naturalmente, do governador Alcides Rodrigues. Até pela tradição de o Senado abrigar ex-governadores. Aí, será a hora de enfrentar um poderoso adversário externo, que vem se reforçando ao máximo: o PMDB de Iris Rezende Machado.
E quem será esse candidato? O PSDB faz o possível para que seja Marconi. Até aqui, o senador é favorito nessa corrida, mas já sabe que terá que negociar com os demais aliados. Tanto é assim que esse tipo de recomposição começou agora, entre ele e o DEM do deputado federal Ronaldo Caiado e do senador Demóstenes Torres. Em 2010, no afunilamento dentro da base aliada, pode ser que os dois partidos estejam atrelados ao mesmo interesse, fazer frente, de igual para igual, com Meirelles do PP.
Em entrevista ao Jornal Opção, publicada nesta edição, o virtual candidato da base em Goiânia, Sandes Júnior, admite que o jogo está totalmente aberto, e ele próprio não descarta a possibilidade de Marconi ter o apoio do PP em 2010. Em outras palavras, a crise atual é tão somente uma luta de momento por melhor posicionamento futuro.