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Conjuntura - 30/07/2008

por Umberto Martins*

 

Em geral, o resultado das campanhas salariais que já foram ou estão sendo fechadas neste ano, especialmente no segundo semestre, revelam que muitas categorias estão conquistando acordos relativamente bons, com reajustes acima da inflação e mesmo redução da jornada de trabalho sem redução de salários.

 

O acordo que o Sindicato dos Metalúrgicos de Caxias do Sul (RS) acaba de assinar com o patronato, prevendo um reajuste acima do INPC acumulado em 12 meses, de 9,4%, bem como o dos químicos paulistas do setor farmacêutico, que conquistaram a redução da jornada para 40 horas semanais, sem prejuízo para os salários, são dois exemplos eloqüentes neste sentido.

 

É, basicamente, em função do crescimento da economia nacional que os ventos favorecem os interesses dos assalariados, o que revela como é importante para a classe trabalhadora a bandeira do desenvolvimento com valorização do trabalho. Todavia, a aceleração do processo inflacionário e a alta dos juros são dois fatores que prometem sabotar o bom desempenho da economia e dos salários, mudando (para pior) as perspectivas da conjuntura.

 

Arrocho silencioso

 

A evolução do rendimento real dos trabalhadores ocupados nas seis principais regiões metropolitanas do país em junho (São Paulo, Rio, Belo Horizonte, Recife, Salvador e Porto Alegre) já revela uma desaceleração no crescimento da renda do trabalho, de acordo com a gerente da pesquisa mensal de emprego do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Cimar Azeredo.

 

Na comparação com maio, a renda média real dos trabalhadores e trabalhadoras caiu 0,3%. Este desempenho já reflete, em parte, a ação corrosiva da inflação em alta, na opinião da economista do IBGE, que pondera também a ação de outros fatores, como as novas contratações por salários inferiores aos dos que já estavam ocupados.

 

Redistribuição da renda

 

A inflação é um instrumento silencioso e perverso de redistribuição da renda entre as classes sociais e a experiência histórica demonstra, com fartura, que suas maiores vítimas são os trabalhadores. Os salários perdem poder de compra diariamente, pois não acompanham a disparada dos preços, que de resto afeta principalmente os alimentos. Isto significa que a inflação, hoje, é maior precisamente para os mais pobres.

 

Para preservar o valor real dos salários ou minorar as perdas, algumas categorias já estão reivindicando redução do prazo de reajustes (atualmente de uma vez a cada ano) ou alguma espécie de ''gatilho'' para garantir a correção da remuneração toda vez que a alta dos preços alcançar certo patamar.

 

Risco para o crescimento

 

A alta das taxas de juros, promovida a pretexto de combater a inflação, também funciona contra os interesses da classe trabalhadora, pois provoca uma redução do consumo e dos investimentos, sacrificando o crescimento da economia. A redução da taxa de crescimento e a possibilidade de estagnação econômica tendem a se desdobrar em aumento do nível de desemprego e redução da renda do trabalho.

 

No curto prazo, a ameaça proveniente da política monetária do Banco Central (que acaba de elevar em 0,70%, para 13% ao ano, a taxa básica de juros) ainda não se transformou em realidade. Porém, poucos duvidam de que o resultado em médio prazo será o desaquecimento do consumo e da atividade produtiva.

 

Trabalho de Sísifo

 

As categorias terão de intensificar os esforços de mobilização e luta seja contra os efeitos corrosivos da inflação seja contra a política monetária do Copom, pois do contrário a modesta recuperação do valor dos salários irá por água abaixo ao longo dos próximos meses ou anos, afogando ou adiando a esperança de desenvolvimento com valorização do trabalho.

 

As estatísticas divulgadas pelo IBGE revelam que o rendimento médio real dos assalariados nas seis maiores regiões metropolitanas, de R$ 1.216,50 em junho, sequer chegou ao patamar do valor registrado em igual mês do ano de 2002, que foi de R$ 1.269,45. Será preciso muita luta para evitar que a classe trabalhadora brasileira seja condenada ao trabalho de Sísifo (1).

 

Nota

 

(1) Sísifo é um personagem da mitologia grega, que a exemplo de Prometeu foi encarado como um inimigo de Zeus (o deus dos deuses olímpicos) e condenado, depois de morto, por toda a eternidade, a rolar uma grande pedra de mármore com as próprias mãos até o cume de uma montanha, sendo que toda vez que ele estava quase alcançando o topo, a pedra rolava novamente montanha abaixo até o ponto de partida. Por isto, esforços inúteis ou tarefas destinadas ao fracasso passaram a ser consideradas como ''trabalho de Sísifo''. Fonte: Sítio vermelho.org.br

 

*Umberto Martins é Jornalista