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Greve na Polícia Civil: a história se repete - 29/10/2013

No último dia 26 de outubro, meu sobrinho Diego completou 27 anos.  Ao relembrar o dia do seu nascimento, observei uma coincidência. No ano de 1986, nesse período, participava do movimento grevista da Polícia Civil Goiana. A União Goiana dos Policiais Civis - UGOPOCI estava à frente de um movimento que ganhou força  com o fechamento do Instituto Médico Legal, que à época funcionava na Rua 66, no fundo do prédio do Instituto de Identificação. Durante 4 dias os corpos deixaram de ser removidos para o trabalho de necropsia e os que estavam no IML, não eram  liberados. O Hospital das Clínicas assumiu parte do trabalho, porém, no prédio estava o corpo de uma pessoa que tinha parentesco com familiares de uma grande emissora de TV local. Muita tensão,  respirávamos o início da reabertura política e greve de policiais não era comum! Hoje 27 anos depois, já aposentada, acompanho mais uma greve da Polícia Civil de Goiás.  O que mudou ao longo desse tempo, em relação à própria instituição Polícia Civil e seus integrantes; as reivindicações ainda são as mesmas? 

Viver um período da história, ser parte integrante de determinada Instituição como servidores, policiais, funcionários públicos, nos dá a condição de sermos observadores privilegiados. Podemos contar a história como verdadeiras testemunhas. Temos condições de fazer uma análise crítica do que o Estado, enquanto Poder Público,  tem feito para que suas instituições prestem serviços de excelência para a população. 

É desanimador ver que sucessivos governos nunca deram a atenção devida para a área da Segurança Pública, em específico a Polícia Civil. Vejamos: na greve de 1986 a reivindicação principal era melhores salários; hoje 26 anos depois, a principal reivindicação é por melhores salários. Os problemas estruturais se agravaram ao longo dos anos. Sucateamento das delegacias e equipamentos, a defasagem  crescente de policiais. Não existe um programa que preveja as aposentadorias, as mortes em serviços ou não e as demissões. Outro problema inexistente naquela época, era o corporativismo dentro da Instituição, fruto de uma política de valorização de uma única classe, a dos delegados, e da negligência dos governantes com as demais.

Em relação à política de valorização de  uma única classe, nem sempre foi assim. A Ugopoci era a maior e mais forte instituição classista da Polícia Civil, agregava todos os segmentos. A medida que o processo de redemocratização se tornava realidade, também outros segmentos classistas ganharam força. Foi a partir da atuação de  uma determinada associação classista, frente as  gestões  dos  governos estaduais  que  cristalizou-se uma  enorme diferença salarial entre delegados ,  agentes e escrivães. Realidade que se por um lado, trouxe benefícios para  a classe dos delegados, por outro demonstrou a falta de planejamento e visão institucional dos representantes e dos governos. Não quero com isso dizer que os policiais civis - agentes e escrivães - são contra a valorização da classe dos delegados, o que gera revolta, foi a forma como foi conduzido o processo de valorização do profissional delegado, sem contudo, analisar que eles estão dentro de uma instituição chamada Polícia Civil, e que qualquer melhoria, deveria ser acompanhada de estudos de impactos não só financeiros, mas de gestão. Tanto em relação às outras categorias, como em relação às condições de trabalho, a estrutura necessária para a atuação de todos os policiais.

Essa diferença ao longo dos anos, trouxe a revolta, a discórdia,  o sentimento de injustiça, que criou  novos perfis de profissionais dentro da  Instituição Polícia Civil, mais preocupados com o "status", com as vantagens do cargo, com o salário e menos com o fortalecimento da Instituição Policial. Se antes dessa valorização corporativista, havia trabalho em equipe,  respeito entre os diferentes profissionais,  admiração e lealdade pelos chefes, hoje  percebe-se  distanciamento, indiferença e um individualismo que compromete a Instituição. Cada um no seu quadrado, realizando aquilo que é sua atribuição. 

Acredito que a violência que hoje preocupa a todos, é consequência também dessa falta de planejamento e investimento nas instituições policiais e isso inclui a valorização dos policiais. Eu disse dos policiais, não dessa ou daquela classe. Enquanto os governos tratarem Segurança Pública com descaso, ou com soluções paliativas, vamos viver de mal a pior. Precisamos ter programas que interfiram na realidade que aí está com previsões de resultados a curto, médio e longo prazo. Agir com indiferença diante das reivindicações dos policiais civis,  pode ser estratégico, do ponto de vista do marketing político, mas demonstra  que  o "Rei está Nu". Qualquer cidadão mais atento conseguirá perceber o pouco que faz o governo com uma área, que é hoje é considerada o maior gargalo da administração, não só local, mas nacional. 

Para o bem de todos, precisamos de governantes sensíveis, que encare o trabalho dos policiais com a seriedade e o compromisso  que a Segurança Pública exige.

Autora: Geralda Ferraz, Escrivã de Polícia  aposentada - radialista - assessora de comunicação