Artigos UGOPOCI

E o Estado continua grande - 28/08/2007

Jornal O Popular – Coluna Cileide Alves – Dia 28/08/2007

A crise financeira do Estado não produziu nada além dos efeitos óbvios, isto é, as dificuldades de sempre, atraso no pagamento das contas públicas, muita incerteza sobre o futuro e as já visíveis conseqüências políticas entre os partidos da base aliada do governo. O Estado perde uma grande oportunidade de buscar o lado bom desse processo de conflito e tensão, se é que é possível encontrar esse lado.

Momentos assim oferecem oportunidade ímpar de reflexão sobre o que levou ao rompimento do equilíbrio financeiro e sobre alternativas para romper o desequilíbrio e, porque não, até tornar-se mais forte que antes da crise. Diferentemente, o Estado faz como a maioria das pessoas faz nessas ocasiões: entrega-se à crise, sofre intensamente e deixa ser destruído.

Esses sinais de auto-entrega são visíveis no comportamento do governo. Desde a posse em janeiro, já se falou em várias medidas, mas apenas saíram do papel uma parte insignificante, haja vista que o déficit das contas públicas não deu o mínimo sinal de recuo. Pelo contrário, continua a crescer indiferente às medidas já tomadas.

E qual oportunidade o governo está deixando passar? A de discutir o modelo atual do Estado e alternativas a ele para ajudar a resolver o crônico problema do déficit público. Marconi Perillo assumiu o governo em 1999 e aceitou o desafio de discutir a estrutura administrativa. Na época, é bom lembrar, o governo de Fernando Henrique Cardoso enxugava o Estado brasileiro. Vendeu empresas públicas, propôs uma reforma administrativa e incentivou os Estados brasileiros a fazerem o mesmo.

Marconi comprou a idéia e fez uma reforma que reduziu a máquina pública, com vista a dois objetivos: cortar gastos públicos e tornar a máquina mais eficiente. No segundo mandato, Marconi deu meia volta e recuou: fez nova reforma administrativa que conseguiu deixar o Estado maior do que era nos governos do PMDB.

A discussão da eficiência administrativa moveu seu governo no primeiro mandato. Já no segundo, venceram as pressões políticas de partidos da base aliada por cargos no primeiro escalão do governo. Na gestão 1999-2002, Marconi preocupou-se em revelar-se para o eleitor como um administrador eficiente e moderno, fundamental para seu projeto de reeleição. Na gestão 2003-2006, moveu-o o projeto de consolidar sua liderança política entre os aliados. A discussão de um Estado eficiente perdeu terreno.

No final do segundo mandato, Marconi foi alertado por auxiliares que deixaria uma estrutura administrativa enorme. Ele chegou a nomear uma comissão para propor uma terceira reforma. Afinal, um Estado pesado, lento, ineficiente e, por isso, caro, não carimba no político a marca de um gestor moderno, com um projeto administrativo eficiente, como ele gostaria de ser reconhecido.

Essa comissão elaborou um terceiro projeto de reforma administrativa, mas não houve mais tempo nem condições políticas para sua implantação. A gestão de Alcides Rodrigues encontrou, portanto, um Estado inchado, com vários órgãos batendo cabeça uns nos outros. Para ficar em apenas num exemplo, três órgãos cuidam do setor agropecuário: Secretaria da Agricultura, Agrodefesa e Agência Rural, todas com autonomia gerencial.

Alcides assumiu solicitando à sua equipe um projeto de reforma. A Secretaria de Planejamento apresentou-lhe dois, um mais arrojado e outro mais tímido. A Secretaria da Fazenda, já depois da posse de Jorcelino Braga, também elaborou uma proposta. Somados ao último projeto de Marconi, foram elaboradas quatro propostas. Todas tiveram o mesmo destino: a gaveta.

O debate sobre Estado mínimo x Estado forte, que parecia vencido pelos defensores do primeiro, hoje já não parece mais tão pacífico. Em encontro recente de gestores públicos no Chile, agências multilaterais como Bird e FMI admitiram que também o Estado mínimo não surtiu o efeito que esperavam no processo de desenvolvimento econômico. Essas agências recolocam a discussão na ordem do dia: qual o tamanho ideal do Estado? Seria um Estado intermediário aos dois modelos: nem protecionista e, conseqüentemente, grande do keynesianismo, nem o Estado enxuto do neoliberalismo, mas um Estado que consiga atender às necessidades do cidadão e também contribuir com a promoção do desenvolvimento econômico?

Independentemente da complexidade dessa questão, a crise financeira do Estado levanta a necessidade da administração pública promover esse debate internamente. Qual a vantagem da atual estrutura administrativa? A quem ela serve? Esse Estado com gorduras visíveis traz algum ganho à sociedade ou serve apenas para sustentar a base política de apoio do governo?

Esse modelo tem custo financeiro, político e social e alguém está pagando por ele. A queda na qualidade de serviços públicos (saúde, educação, segurança pública), os atrasos nos pagamentos dos programas sociais, de outras despesas como o Terceira Via, programa de manutenção e recuperação de estradas, a falta de dinheiro para investimento, indicam que a sociedade paga sozinha essa conta. A população sustenta uma estrutura administrativa ineficiente e cara apenas para atender aos interesses políticos do governo de plantão.

Pergunta da semana

Se o Estado não paga R$ 32 milhões mensais aos programas sociais (Bolsa Escola, Renda Cidadã), se não paga prestadores de serviço (Terceira Via) nem outros compromissos (nem mesmo aluguel de uma escola, como O POPULAR revelou na semana passada) por que o déficit público ainda não acabou? Como a palavra a Secretaria da Fazenda.