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Base aliada de novo no ringue - 10/12/2007

Jornal O Popular – Coluna da Cileide Alves – Dia 10/12/2007

Divergências e diferenças de pontos de vista são absolutamente normais entre duas pessoas, ainda mais entre políticos de personalidades, formação político-ideológica e visão de mundo antagônicas. Mesmo assim, essas pessoas podem se relacionar bem se souberem lidar com as diferenças. Não é o que tem acontecido entre o governador Alcides Rodrigues e o senador Marconi Perillo.

As diferenças entre eles passaram despercebidas nos dois governos de Marconi, porque Alcides foi um vice-governador discreto. Elas ganharam visibilidade depois da posse de Alcides como governador. Alcides assumiu em 31 de março de 2006 um governo que não era o seu; era o de Marconi. Depois de sete anos no poder, era natural que Marconi deixasse uma rede grande de tucanos e de simpatizantes no governo. Esta foi a herança de Alcides.

O governador tomou posse em seu mandato solo, em 1º de janeiro, e praticamente não mexeu na estrutura arquitetada pelo antecessor. Deveria ter feito as mudanças logo após a posse, mas como isso não faz parte de seu estilo, foi adiando decisões que mudariam o perfil do governo. Alcides tem todo o direito de mudar essa estrutura para deixá-la a sua imagem e semelhança, e não tem como fazer isso sem incomodar tucanos, majoritários no poder na era Marconi. Até aí, é uma acomodação que estava no script.

Mas as desavenças entre o grupo que entrou e o que saiu do poder não se resumiram a divergências sobre substituição de pessoas e mudanças no jeito de tocar a máquina administrativa. Diferenças entre Alcides e Marconi surgiram de assuntos inesperados e começaram a se multiplicar. Cada dia um novo mal-estar. Às vésperas de Alcides completar um ano de governo, não há ninguém, nem no PP nem no PSDB, capaz de negar que a relação entre o antecessor e seu sucessor nunca esteve não mal.

A gota d’água vazou na semana passada. Tudo começou com a reportagem da revista Veja, que circulou em 1º de dezembro, sobre um suposto esquema de espionagem contra Marconi que teria partido da polícia do Senado. Ao comentar a denúncia em entrevista à imprensa, Marconi disse ter sido alertado sobre o tal esquema pelo secretário de governo Fernando Cunha. Na versão do senador, Fernando o procurou a pedido de Alcides, que teria sido avisado pelo ex-deputado Abdul Sebba.

Parece que Alcides não gostou de ver seu nome envolvido nessa história e na segunda-feira nem pensou duas vezes: negou que tivesse tomado conhecimento do fato e que tenha pedido ao secretário Fernando Cunha para ser o mensageiro da notícia a Marconi. Em outras palavras, desmentiu Marconi.

O tom da reação do senador, no mesmo dia, foi duro: “Eu creio na palavra do dr. Fernando Cunha como creio na palavra dos meus pais, da minha mulher e das minhas filhas, portanto, irrestritamente. Fernando Cunha é sério, íntegro, responsável, ético, leal, de elevadíssimo espírito público, jamais foi dissimulado. Um homem com a idade e a história dele jamais se prestaria ao papel de inventar algo tão sério quanto isso.”

O mais importante dessa declaração não é o que ela diz textualmente, mas o que está implícito. Marconi deixa claro em quem confia (Fernando Cunha) e, por exclusão, em quem não confia. Esse episódio deixou marcas profundas nos marconistas, porque ele não foi visto como um fato isolado, mas como mais uma de uma série de ações que, na visão deles, teriam o propósito de desconstruir a imagem e os governos de Marconi Perillo.

O gesto de Alcides foi além do que ele expressou por meio das poucas palavras naquela entrevista. Os tucanos sentiram como um gesto de quem não é companheiro de Marconi ou mesmo um aliado político. E pintou a dúvida: o governador é companheiro de Marconi? Essa incerteza desnorteou os tucanos, por isso a relação entre os dois lados piorou muito na semana passada.

Inevitável que tirassem as outras feridas do baú. Estão listando casos em que o governo de Alcides expôs, direta ou indiretamente, propositalmente ou por acaso, as gestões de Marconi Perillo. Começou logo após a posse, em janeiro, quando Alcides revelou que o Estado acumulava déficit entre receita e despesa que começou em R$ 50 milhões e agora está em R$ 97 milhões, segundo a Secretaria da Fazenda. Depois o governo fez questão de esclarecer que o crescimento da folha de pagamento do Estado, provocado pelos planos de cargos e salários concedidos por Marconi Perillo em 2006, é o “câncer” das contas públicas.

Lembram que ao anunciar a reforma administrativa, o governo incluiu na lista dos órgãos que teriam sido herdados do governo anterior secretarias criadas por Alcides, caso das Secretarias de Justiça e da Mulher. Os tucanos também reclamaram que o governo não incluiu as seis secretarias extraordinárias entre os órgãos do primeiro escalão, duas delas também criadas agora. Lembraram-se que Alcides disse que não tinha conhecimento, quando acham que ele tinha, do relatório preparado pelo secretário José Carlos Siqueira, a pedido de Marconi Perillo, com números bem mais favoráveis a seus dois governos.

Essa sucessão de fatos ganhou uma releitura com o episódio da semana passada: o PSDB acha que pode ser uma articulação com vistas a desconstruir e, mais até, a desmoralizar Marconi. Esse sentimento deixou os tucanos sem chão, pois já duvidam da firmeza do terreno em que estão colocando os pés. A eles interesse preservar a imagem de Marconi e de seus governos e também o relacionamento com o governo de Alcides Rodrigues, do qual também fazem parte. A briga não seria interessante nem para o governador Alcides, pois ela poderia respingar na Assembléia Legislativa, entre prefeitos e partidos aliados.

A semana que começou em temperatura alta, terminou com muitas iniciativas de pacificação. Entre os vários encontros, o mais importante foi entre Marconi e o secretário Jorcelino Braga, quinta-feira. Por enquanto as duas partes estão tentando curar feridas para, só depois, vislumbrar alternativas para apaziguar os ânimos. Nada é impossível, mas a última ferida vai demorar muito para sarar. E vai deixar seqüelas.