Causos, contos e prosas

Lili

 

 

         Senhor Delegado.

 

O senhor tem que dar um jeito na Lili, uai!... Ontem,

por volta das 21:00 h, com certeza aproveitando o restinho do feriado, ela foi com o pai e a mãe para o BAR DA ESQUINA, e aprontou lá o maior regaço. Não sobrou um só taco de sinuca inteiro. Foram todos, literalmente reduzidos a cacos e cavacos nas cabeças e cacundas de todo mundo. Vou falar, mas o senhor não vai acreditar: se os vossos olhos estivessem lá, estarrecidos haveriam de ver, voando pelos ares, de norte a sul e de leste a oeste, até mesas de sinuca  arremessadas nas cabeças uns dos outros. Coisa mais horrorosa...

 

            E na do coitado do Lelé,  precisamente o pai da Lili – pivô de toda aquela confusão – uma garrafa de cerveja teve o mesmo destino, que teve aqueles tacos. Virou só cacos. Fez-lhe grande rombo no couro cabeludo. E nas suas costas, o golpe de uma faca. E dizem que essa lâmina, no momento em que operava, estava nas mãos do Pereirinha, filho da dona Nanci, dona também da mesma retro-citada empresa: o  BAR DA ESQUINA, sediada igualmente na circunscrição do Terceiro de Aparecida, do qual é Vossa Senhoria o bravo, intrépido, e mui competente titular.

 

         Doutor Ovídio, tudo começou quando uma dançarina desajeitada esbarrou... – sim, porque no BAR DA ESQUINA se bebe e se dança também. Pois então, essa bailarina 'trapalhona teve a fatídica sorte de, bruscamente, esbarrar na cadeira da mãe da Lili, gênese, como já se disse, de toda aquele meu-deus-do-céu-o-quê-qué-isso. O Lelé, bravo e mui dedicado pai da Lili,  ficou mui nervoso com aqueles maus jeitos. Imagina... logo pra cima de quem ele quer tanto bem?! E foi na bucha tirar satisfação com a dançarina trapalhona. A Lalá, mamãe da Lili entrou no meio e não deixou:

 

-         Foi sem querer, meu bem! A moça não viu!

 

Mas a pouco de ter baixado até a última porta daquela

empresa, e haver, a mãe da Lili, colocado longe um do outro os dois que se estranharam, a confusão recomeçou... outra vez!  Oh, meu Deus do céu!... – Agora do lado de fora da firma. Foi quando aconteceram a facada e a garrafada. 

 

         Data Venia, Senhor Delegado, este mui cioso e prolixo escrivão de seu cargo, para poupar-lhe muita fadiga, avisa logo a Vossa Senhoria, que não adianta mandar intimação pra Lili não. Deixa ela fora disso. A moça não sabe ler. Nem escrever. Não sabe assinar, sequer com as digitais do seu polegar. Oriunda das abençoadas entranhas de sua mãe ela chegou aqui neste mundo velho e feio, cheio de muita guerra, ‘ind’agorinha, Senhor Delegado! Não mede ainda direitinho nem uns poucos trinta dias de vida, ora essa...!

 

 

                                                                                                Chiquim

                                                                                     O ESCRIVÃO

PRONTO. Em 21.03.06 - 18:15 h